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maio 29, 2011

Cavaquinho & Chorinho: novas paixões!

Hoje quero falar sobre este momento de encantamento que estou vivendo em minha vida.... o reencontro com a música, o namoro com o cavaquinho e o aprofundamento no choro.

Estudo música desde meus 5 anos de idade... sou filha de músico... desde meus 24 anos só namorei músicos (confesso que quero quebrar esta tradição, mas esta 'raça' me atrai, rsrrssrs) ... ouço muita música, de vários estilos (de concerto, jazz, samba, choro, árabe, flamenco, blues, soul...) mas, há um bom tempo, tenho preferido a  instrumental. 

Poderia ter sido uma super pianista... mas não fui. Não sou. Poderia ter sido também uma super violonista.. mas não fui e não sou.  Poderia ter  sido compositora.... mas advinhem?
Sou volúvel neste universo artístico... me deixo levar por várias paixões.. são tantas possibilidades encantadoras! Mas não pensem que não sofro. Sofro muito com isso!! Tudo que eu queria ser é uma especialista. Mas sou uma mulher renascentista..... 

Há 10 anos comecei a mudar meus rumos e caminhar na trilha do palhaço... um caminho muito forte que me arrebatou.. e, aos poucos, fui me afastando profissionalmente da música. Esta, começou a funcionar apenas como ferramenta de trabalho, para criar meus nºs de clown.. 
Ouvir ? Sempre.
E em 2008 comprei um cavaquinho para a Felyscia, minha palhaça. Um instrumento fácil de transportar.. leve.. delicado. Fiz uma aula para uma oficina de palhaço, me apaixonei..... mas não fui adiante.

Pois bem, decidi este ano voltar para os pequenos braços do cavaco... e confesso aqui, que em meio a uma crise existencial muito forte .. (tá... também confesso que estou sempe pensando 'quem sou? de onde vim? porque? pra onde vou?... quem me conhece sabe.... ai, um saco!!) 

Mas enfim, gosto de estudar... queria fazer um mestrado com palhaço, já não sei se quero mais... então pensei: estudo música. De novo. Ela sempre volta.... porque na verdade nunca se foi. É arraigada.. enraizada.. genética.. alma.

E num momento total de falta de encantamento na minha vida........ me apaixono!! Arrebatadoramente.. sem defesa.. e entro nesta história de corpo e alma, como há muito, mas muito tempo, não acontecia algo assim, em nenhum sentido.. achava que nada me traria este frisson.

Pois bem, estou estudando o cavaco no choro. 

(Cândido Portinari)

Sempre soube que o choro é um estilo para virtuoso. Sofisticado.. passei por ele no estudo de violão na UNIRIO... sempre ouvi.... sei que é em 3 partes... mas só semana passada me caiu a ficha!! 

Foi dado em aula, a música 'Naquele Tempo' de Pixinguinha (já gostava muito dela).. aí me lembrei que a tinha em casa em partitura. 

Cheguei, fui para o piano estudá-la.... fui tocando devagar... e ficando boquiaberta.... comecei a chorar (novidade né?!) de emoção. Cada uma das 3 partes é em um tom diferente, com melodia e ritmo próprios.... se ouvirmos em separado pensaremos que são 3 músicas diferentes.... se a ouvirmos juntas, elas conversam entre si.... é genial!! 

E assim é em quase todos os choros.. a construção melódica belíssima, coisa de música erudita.. de uma complexidade impressionante.. extrememente moderno!!! Não tem como esse estilo ser popular, digo de massa, ... por ser instrumental e tão sofisticado.

Existem alguns mestres, entre tantos mestres: Ernesto Nazareth (Brejeiro,  Odeon, Batuque, ) Pixinguinha (Rosa, Lamento, 1x0, Cochichando, Naquele Tempo, Carinhoso....), Jacob do Bandolim ( Noites Cariocas, Benzinho, Assanhado,Doce de Coco, Vibrações.............)

                                                     (Pixinguinha e os Oito Batutas)

 (Pixinguinha..........)
 
Tenho ouvido muito choro... prestando atenção nas partes.... tirando harmonia.. entendendo a linguagem.. e quanto mais ouço, mais entendo, e mais encantada fico... assim como me encanta também a redescoberta  deste estilo, pelos jovens, tido como música de velho ...

A cada dia surge uma roda de choro por esta cidade tão linda, nos levando, como numa máquina do tempo, por entre os casarões da velha cidade, para um passado, que se funde com o presente e se perpetua no futuro... o choro, um estilo tipicamente carioca.

Para gostar de alguma coisa, ou não, é preciso conhecê-la.
É preciso ter olhos de ver, ouvidos atentos e coração e mente abertos.....







maio 08, 2011

Um retirante no CCBB

Bem, eu deveria ter escrito este texto há exatamente 1 mês atrás... mas tanta coisa acontece, e o tempo voa... então só agora o faço... mas como diz o ditado: 'antes tarde do que nunca'...srrsr.
Vamos lá!

Neste dia em questão, havia ido com  uma amiga, que não via há muito tempo, ver um show no CCBB. Darei um nome falso para ela.. deixe-me pensar.... CORALINA!!

Bem, ao sairmos do CCBB, descendo os degraus da entrada magnânima na 1º de Março, demos de cara com um homem parado no cantinho, se protegendo da chuva (tava chuviscando).  Nos assustamos, íamos embora, quando ele começou a falar com a gente... ficamos por 1 segundo em dúvida, se parávamos ou não.... se era mais uma pessoa pedindo dinheiro.. mas nos olhamos e alguma coisa nos fez parar... 

Ele queria uma informação... começou a falar... falar muito e muuuito rápido... não entendíamos absolutamente nada... só entendi que ele era do interior da Bahia... um matuto, no melhor sentido da palavra. Um retirante.. uma pessoa simples, do interior ... com aquele sotaque fortíssimo, embolando literalmente as palavras ( eu devo ter feito muita careta tentando entender o que ele dizia) .. parecia um dialeto... e ele estava visivelmente nervoso, cansado, deseperado. Falando que queria voltar pra casa... que nunca mais voltaria pro RJ, que não precisava disso, que queria só plantar e criar as galinhas dele. 

Não estávamos entendendo nada, e já ficando nervosas.. e ele repetindo, repetindo, como um disco furado. Um desepero....Pedimos para ele falar devagar... e aí, entendemos a história:

Ele tinha um irmão que já morava no Rio de Janeiro... então ele combinou com ele de vir de mala, cuia e família, pro Rio, tentar a sorte. Só que veio, um tempo depois, sem confirmar... saiu da fazenda na frente (a família viria 2 dias depois com bagagem) enfrentou 2 dias de viagem, chegou na casa do irmão e................. este tinha ido para o Paraná!! Sem falar nada!! 

Ele ficou deseperado, voltou para rodoviária, sem dinheiro, e implorou ao motorista por um lugar em pé ou no bagageiro, para voltar para casa antes de sua família vir!! Olha que loucura!!!!!!! Claro que ninguém permitiu... você vale o que tem... se não tem dinheiro não tem nada. 
Morremos de dó.... mas, o que fazer?? 

Ele não tava pedindo dinheiro.... queria ir para alguma instituição que o ajudasse... já tinha ido na catedral, mas esta o ignorou dizendo que teria que ir para o abrigo.... nem pensar, disse ele.

Bem, o que fazer diante dessa situação?! Foi então que Coralina disse que iria até a Rodoviária com ele ver como ajudar. Fiquei parada olhando para ela... eu tava na rua desde 7 e meia da manhã, ou sejá há 12 horas... tava exausta... ela sabia disso, me 'mandou' voltar para casa e saiu correndo e entrou num ônibus com ele. Eu fiquei com cara de idiota na rua, me sentindo péssima por não ter ido com ela.. e preocupada pensando naquela história doida... liguei pra ela e pedi que me ligasse quando chegasse em casa.

Ela me ligou depois... tentou de tudo na empresa... e decidiu comprar a passagem... uns R$ 300,00 ... deu um jantar pra ele e um dinheiro suficiente para comer durante a viagem de volta. Ele ficou tão feliz!! Iria conseguir evitar a vinda da família... (espero que tenha dado tudo certo).Ele deu muita sorte! A estrela dele é muito boa...

Pois é..... agora vem as reflexões....fiquei muito mexida com tudo isso.

1) O que teria sido dele se não tivesse encontrado a Coralina? Estaria na rua. Numa cidade como Rio de Janeiro... e a família dele? Perdida também.... Isto já deve ter acontecido é muito neste Brasil tão grande, com tantos contrastes... aliás, deve estar acontecendo agora em algum lugar!

2) Se eu estivesse sozinha não teria parado... devo confessar, a contragosto, que sou dura, fria, medrosa, como muitos nesta cidade. Eu, palhaça, artista, cheia dos discursos, teria deixado ele lá.... à sua própria sorte. Não é fácil para mim admitir isso...

3) Admirei, e invejei a atitude de Coralina... corajosa, solidária, desapegada, amorosa...sou feliz por tê-la como amiga !

4) Porque somos, ou nos tornamos, frios, desconfiados, medrosos, amargos, distantes...? Claro que provavelmente você vai responder: 'porque tem muita gente mentirosa, mau caráter, que se aproveita de sua boa vontade, te manipula, para se dar bem..' mas será que não usamos isso como álibe para fechar os nossos olhos totalmente, não discernindo o joio do trigo? 

Estou falando por mim.... e talvez por muita gente....  mais uma vez, filosofando, refletindo.....

'...eu quase não falo, eu quase não sei de nada
sou como rês desgarrada, nessa multidão boiada caminhando a esmo...' 
(Lamento sertanejo, Gilberto Gil)